quarta-feira, 6 de maio de 2020
Cangaceiros 18
–– Arilson tu-tu sa-sabes, que-que o Chi-Chi, Chico Pre-Preto é um pen-pen, pensa, pensador.
–– Fica na tua aí Gaguinho, deixa o homem falar.
–– Tá-tá, bom.
–– Arilson é o seguinte: tu estás vendo aqueles dois bois ali no pé da cerca que tu alimenta há dias?
–– Sim, estou vendo! O que tem eles?
–– Ninguém vai vir busca-los.
–– Como é que tu sabes disso?
–– Põe as ideias no lugar homem de Deus! Quem vier buscar será considerado culpado e denunciará quem mandou matar a filha de Maroca e o filho do Manoel Espicha Couro. Estás me entendendo? Ademais quem é que sabe se não é uma armadilha do delegado? Então, pode ter certeza, os bois são seus e servirá muito bem para o churrasco da festa.
–– Hum! Mas se for de outra pessoa?
–– É nada! Ninguém virá reclamar. Faz o churrasco com eles e pronto.
–– Chico eu não quero envolvimento com bandido, com jagunços, cangaceiros ou com a polícia.
–– Depois não diga que não avisei.
–– Vamos fazer assim, amanhã bem cedo, tu e o Gaguinho virão para cá, a gente mata os bois e dá a carne para quem tem fome, para as famílias mais carentes.
–– Po, pois tá, taí que, que eu gos, gostei.
–– Distribuir de graça?
–– É. Só quero o couro, os chifres e a buchada pra fazer panelada. Vocês podem avisar o povo pobre, mas só os mais necessitados. Senão vai chover de gente querendo.
–– Tá muito é bom assim. Mas nossos pedaços a gente tira primeiro e tu guarda viu Arilson?
–– Ah, e a carroça eu quero para fazer é lenha pro fogão. Os bois da festa eu darei um jeito de arranjar. Pois vão logo avisar o povo, aí dá mais de 500 quilos de carne.
–– É. Os bichos são gordos. Pois vamos Gaguinho.
–– Va, vamos!
Lá fora vai passando o Senhor José, montado num burro preto, mais conhecido como Zé do burro, o animal é bom, bem tratado e estradeiro.
–– Seu Zé, quer vender o burro? – indaga Chico Preto.
–– Vendo! – responde o homem já freando o animal pelas rédeas, bem em frente a bodega.
–– Quanto é Seu Zé?
–– Rapaz é 150!
–– Dou cem no pau!
–– Não, meu filho, só vendo todo!
––Vai te lascar, véi. Eu quis dizer foi à vista.
–– Pois vão para a baixa da égua, seus filhos duma ronca e fuça!
–– Deixem de gaiatice e vão procurar o que fazer. Vão!
–– Já vamos Arilson! Armaria, nãm! Ninguém pode nem brincar.
Na estrada de chão que dá acesso à fazenda, avista-se de longe o carro que se aproxima. Inácio, com a mão na orelha desce apressado e entra em casa enquanto os jagunços saem e esperam fora da casa grande.
–– Cadê meu pai – indaga à criada.
–– Está na sala dele.
–– Meu pai, tenho um problema sério!
–– O que aconteceu?
–– Ontem quando fazíamos campanha pelo interior, parei na bodega do Arilson e me meti numa confusão.
–– O que houve com sua orelha?
–– É isso que estou explicando. Tivemos uma briga lá nessa maldita bodega e um cangaceiro por nome Gerônimo, ele e outros três ou quatro homens humilharam a gente. Quando fui tomar as dores, ele voo em mim e cortou minha orelha. Depois, apontando armas para nós, amarrou-nos, tomou a chave do carro e jogou no mato. E para completar disse que aqui não tem homem de honra.
–– Conheço bem teu temperamento, sempre querendo ter razão. Chegou na bodega com arruaças, não foi?
–– Não pai. A gente estava pedindo voto. Lá estava cheio cachaceiros e jogadores. Todos viram a humilhação porque passamos. E ainda teve um desgraçado que falou que eu tive foi sorte de ele não cortar minha garganta, apartar a cabeça do pescoço para mandar para o Senhor?
–– Filho toda ação tem reação. Eu sempre disse que antes de eleição a gente tem que engolir sapos.
–– Ah, mas não é assim que o Senhor vem agindo. Aqui na fazenda o Senhor bate e manda bater em escravos e até em funcionários e já até matou...
–– Baixa o tom de voz, seu moleque. Tá pensando que tá falando com seus parceiros? Tu me respeitas.
–– Desculpas, pai! Me exaltei.
–– Onde mora esse bandido?
–– E quem é que sabe? Lá mesmo disseram que ele estava só de passagem para comer.
–– É uma afronta à nossa família. Não resta dúvidas, mas não vou colocar meus homens e nem vocês nessa celeuma.
–– Se o Senhor deixar, eu mesmo com meia dúzia de homens entro nas brenhas atrás dele.
–– Inácio, um homem de verdade resolve as coisas é na hora, nem que morra, mas é na hora. Tu andavas com três jagunços que sabem atirar, brigar e cai numa armadilha dessas. É inaceitável. O que é que esse povo vai falar? Que cortaram a orelha do filho de Messias para dar uma lição ou mesmo para mandar uma mensagem? É isso?
–– Pai espera! Deixa que eu resolvo isso!
–– Onde estão os homens e as armas deles?
–– Os homens estão lá fora.
–– E as armas?
–– Eles levaram. Espingardas, revólveres e facas.
–– O que faltou? Deixar vocês nus? Bem, vamos oferecer uma recompensa para quem trouxer esse homem vivo, pode ser apanhado, ferido, mas vivo. Eu mesmo quero arrancar os olhos dele para ele saber com quem se meteu.
(...)
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