sexta-feira, 14 de junho de 2019

CANGACEIROS 6




Um caboclo mais frio, arrasta duas ou três canas da carroça, desfolha-as, põe em cima do peitoril, e pega uma a uma e vai descascando, corta em cruz alguns gomos pequenos e mastiga – eita porra! Essa é das boas! Doce que só o mel!

Outro mais aproveitador, pega alguns fechos e leva-os para seus animais devorarem enquanto estão amarrados no pé da cerca e assim, seguindo o exemplo, outros fazem o mesmo, pegam os fechos para alimentar suas montarias, afinal, alguns jogadores viciados em baralho, sinuca e dama vem de longe montados em cavalos, burros e jumentos, todos arreados com boas selas, alguns mais pobres, usam cangalhas nas montarias. A concepção é de que a carga está perdida mesmo e o que importa naquele momento são os corpos, então, deixa os bichos comerem as canas.

Os bois estão babando de calor com o sol a pino, mas ninguém vê isso. Bem, quase ninguém. Benedito sugere tirar a canga da parelha de bois e decide dar uma parte das canas e água para os animais à sombra do grande pé de jatobá e enquanto isso acontece, pessoas da região aglomeram-se. O boato boca a boca se espalha rapidamente. Não há melhor publicidade do que fofoca no interior. Até parece que todos moram perto um do outro. Não se sabe por que as coisas ruins ganham mais repercussão do que as coisas boas.

Gaguinho chega à delegacia, amarra o cavalo num pé de oiti e adentra apressado.

–– O-olá! C-ca-cadê o De-dele-delegado? – pergunta ele a um recruta no balcão.
–– Está na sala dele. Aguarde aí. Ele tem uma visita importante. Vixe! Tá avexado assim por quê?
–– M-mas é, é um ca-caso de vi-vida ou mor-morte!
–– Tenha calma, gaguinho! Aguarde sua vez! Ôxe!!

A visita importante como o recruta falou, trata-se de um homem que certamente é o braço direito do Coronel Messias que veio trazer propina.

–– Pois muito bem Senhor Lucas. Quanto ele mandou dessa vez?
–– Está tudo aí nesse envelope, conforme o Senhor pediu. Agora ele disse que é para o Senhor fechar oszói, caso alguma coisa ruim venha a acontecer ou dar errado – diz o capanga de Coronel Messias.
–– Hum!! Ô cabra arretado de palavra!
–– Delegado, com sua licença, tem um gaguinho aperreado querendo falar com o Senhor. Ele tá realmente agoniado.
–– Terminamos aqui, Lucas, mas pode ficar enquanto atendo essa ocorrência. Mande-o entrar, cabo.

Gaguinho já está para botar os bofes pela boca, e nesse interim, chega Chico Preto ainda mais nervoso que o outro.

–– Quero falar com o Delegado. Ele está aí?
–– O que houve?
–– Tenho que avisar a ele do furdunço que aconteceu no bar do Arilson.
–– É o mesmo assunto do gaguinho?
–– É. Mas sei explicar melhor para a autoridade não perder tempo.
–– Pois emburaca, já que ele está lá dentro!
–– De-de-de...
–– Delegado! - Completa o policial.
–– N-não! De-de-defunto!
–– Defunto, onde?
–– O diabo quando não vem, manda o secretário.
–– Cala a boca Lucas – repreende o Delegado.
–– No, no car-carro de bó, boi.
–– Que carro gaguinho?
–– No bar.
–– Entendi. Defunto no carro de boi, no bar. Onde fica o bar?
(...)

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