terça-feira, 25 de junho de 2019

CANGACEIROS 12




–– Ninguém quer passarinho aqui não, menino – diz um dos jogadores de sinuca.
–– Moço, é para ajudar lá em casa. Comprar arroz e feijão.
–– Vai estudar – fala o parceiro no jogo – se eu tivesse estudado num tava aqui jogando sinuca, sendo besta.
O menino sai de mesa em mesa oferecendo os pássaros e ninguém dá a mínima atenção. Jogador de baralho só tem olhos para as cartas. Não ouve ninguém fora do jogo. Fica matutando o jogo até descobrir qual a próxima cartada. Tem uns que varam a noite e ficam de olhos fundos.
O garoto não tem argumentos para convencer e sai, mas antes, oferece ao dono do recinto.
–– Seu Arilson compre pelo menos o bigodinho, ele cantará rapidinho assim que deixar de ficar “enfesado”, pra eu comprar nem que seja só o feijão para comer com farinha e sal. Lá em casa num tem nada hoje para comer – diz a criança com cara de tristeza.
–– Menino quanto é os três com gaiola e tudo?
–– Ah, só os passarinhos é uma coisa, agora com a gaiola é outra!
–– Sim, mas quanto é? – Insiste Arilson.
–– Bote preço! Eu tô é precisando mesmo.
–– É o seguinte: Vou lhe dar o arroz, o feijão, a farinha e o sal, mas vou soltar os pássaros e quebrar a gaiola.
–– Faça isso não seu Arilson! Uma gaiolinha dessas dá um trabalho danado para fazer.
–– Menino, você gostaria de estar numa jaula?
–– Não Senhor.
–– Então vá estudar! E venha aqui uma vez por semana que lhe dou arroz e feijão se você for para a escola ao invés de caçar passarinhos.
–– Vai me dar tudo isso agora?
–– Vou.
–– Então pode soltar e quebrar a gaiola.
–– Sim, mas você vai para a escola?
–– Não tenho mais pai para me matricular e minha mãe não tem condições de ir lá no grupo escolar. É muito longe.
–– Pois depois vem aqui que te levo para matricular, viu?
–– Viu!
–– Olha o Arilson parecendo o Papa, dando exemplo.
–– E tu tava só caladinho aí, observando, né?
–– É, mas já, já vou voltar para casa. Minha mulher tá esperando um bruguelo! – afirma Benedito.
–– Opa! Isso é bom demais!
–– Pois bota aí uma serrana!
–– Boto e digo mais. Vou ajudar no mijo do menino!
–– Pois capricha! Vai ser antes da eleição!
–– Rapaz! E tu votas em quem?
–– Eu acompanho meu pai. Em quem ele decidir votar, a gente vota.
–– Tu sabes que o melhor candidato é o prefeito, né?
–– Sim, ele é um homem de palavra. Tudo que prometeu, cumpriu, mas o meu velho é quem decide. A gente o acompanha desde a primeira votação.
–– Seu Joaquim da Silva também é um homem bom, respeitável.
–– Por isso mesmo.
–– Arilson, todo ano ele faz uma festa de aniversário, e esse ano quero te ver lá. Você nunca foi. Quero te apresentar a ele. Tu és um dos melhores amigos que tenho por essas bandas.
–– Vou mais é na hora, avexado!

Nessa manhã, na fazenda do coronel Messias, dois vereadores de oposição são esperados para o almoço.

–– Lucas, quanto tu achas que devo pagar a esses trastes da oposição?
–– Coronel vou te dizer uma coisa, eles só estão na oposição porque estão insatisfeitos com o prefeito. Talvez ele – o prefeito – não tenha dado muita importância. Não tenha dado cargos ou dinheiro.
–– Por isso mesmo. Eles foram eleitos na rabada. Os dois quase não tem votos.
–– Na minha opinião, o Coronel deve convencê-los a trazer pelo menos mais dois do lado de lá para o lado cá. E eles não vão cobrar pouco não, viu?
–– Lucas, eu tenho casas na cidade sem serventia nenhuma. Nem ocupadas elas estão. Não são grandes, mas tem um valor de mercado muito bom! O que tu achas?
–– O Senhor oferece as casas sem passar o documento agora e promete uma quantia em dinheiro caso eles consigam trazer os dois vereadores mais insatisfeito. Aí somamos quatro, o que já equilibra a balança.
–– É isso mesmo, porque o presidente da câmara não vem para cá nem a pau.
–– Esse não vem mesmo. É o mais bem votado na eleição anterior.
–– Lucas tive uma ideia melhor. Para ficar bem equilibrada mesmo essa campanha, na base do quatro a quatro, ou seja, a mesma quantidade de vereadores do lado de lá e do lado de cá, a gente poderia dar um fim no presidente.
–– O Senhor quer tirar o homem da jogada, Coronel?
–– É claro! Ele é o maior puxador de votos do prefeito. Se você fizer um serviço bem feito, digo, fazer parecer um incidente, será uma perda e tanto. Temos que ganhar essa eleição de qualquer jeito.
–– E o Elesbão ficará sabendo disso?
–– Ninguém, mas ninguém mesmo deve saber, nem o Elesbão. Isso fica só entre nós dois e mais dois homens da nossa confiança.
–– Coronel, essa é uma jogada muito arriscada num período como esse.
–– Só será arriscada se você não fizer o serviço direito. Ademais, o Delegado Jaime está na minha folha de pagamento. Então, quem é que irá investigar isso?
–– Coronel, não é aproveitando a oportunidade não, visse, mas eu tenho uma caboclinha que gosto muito. Ela ainda vive na casa dos pais e como o Senhor falou dessas casas na cidade sem serventia nenhuma, gostaria que o Senhor me desse uma para a gente se arrumar por lá, fazer um chamego, uns cafunés.
–– Eita Lucas, tu não perdes tempo.

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