–– Ninguém quer passarinho
aqui não, menino – diz um dos jogadores de sinuca.
–– Moço, é para ajudar lá em
casa. Comprar arroz e feijão.
–– Vai estudar – fala o
parceiro no jogo – se eu tivesse estudado num tava aqui jogando sinuca, sendo
besta.
O menino sai de mesa em mesa
oferecendo os pássaros e ninguém dá a mínima atenção. Jogador de baralho só tem
olhos para as cartas. Não ouve ninguém fora do jogo. Fica matutando o jogo até
descobrir qual a próxima cartada. Tem uns que varam a noite e ficam de olhos
fundos.
O garoto não tem argumentos
para convencer e sai, mas antes, oferece ao dono do recinto.
–– Seu Arilson compre pelo
menos o bigodinho, ele cantará rapidinho assim que deixar de ficar “enfesado”,
pra eu comprar nem que seja só o feijão para comer com farinha e sal. Lá em
casa num tem nada hoje para comer – diz a criança com cara de tristeza.
–– Menino quanto é os três
com gaiola e tudo?
–– Ah, só os passarinhos é
uma coisa, agora com a gaiola é outra!
–– Sim, mas quanto é? –
Insiste Arilson.
–– Bote preço! Eu tô é
precisando mesmo.
–– É o seguinte: Vou lhe dar
o arroz, o feijão, a farinha e o sal, mas vou soltar os pássaros e quebrar a
gaiola.
–– Faça isso não seu
Arilson! Uma gaiolinha dessas dá um trabalho danado para fazer.
–– Menino, você gostaria de
estar numa jaula?
–– Não Senhor.
–– Então vá estudar! E venha
aqui uma vez por semana que lhe dou arroz e feijão se você for para a escola ao
invés de caçar passarinhos.
–– Vai me dar tudo isso
agora?
–– Vou.
–– Então pode soltar e
quebrar a gaiola.
–– Sim, mas você vai para a
escola?
–– Não tenho mais pai para
me matricular e minha mãe não tem condições de ir lá no grupo escolar. É muito
longe.
–– Pois depois vem aqui que
te levo para matricular, viu?
–– Viu!
–– Olha o Arilson parecendo
o Papa, dando exemplo.
–– E tu tava só caladinho
aí, observando, né?
–– É, mas já, já vou voltar
para casa. Minha mulher tá esperando um bruguelo! – afirma Benedito.
–– Opa! Isso é bom demais!
–– Pois bota aí uma serrana!
–– Boto e digo mais. Vou
ajudar no mijo do menino!
–– Pois capricha! Vai ser
antes da eleição!
–– Rapaz! E tu votas em
quem?
–– Eu acompanho meu pai. Em
quem ele decidir votar, a gente vota.
–– Tu sabes que o melhor
candidato é o prefeito, né?
–– Sim, ele é um homem de
palavra. Tudo que prometeu, cumpriu, mas o meu velho é quem decide. A gente o
acompanha desde a primeira votação.
–– Seu Joaquim da Silva
também é um homem bom, respeitável.
–– Por isso mesmo.
–– Arilson, todo ano ele faz
uma festa de aniversário, e esse ano quero te ver lá. Você nunca foi. Quero te
apresentar a ele. Tu és um dos melhores amigos que tenho por essas bandas.
–– Vou mais é na hora,
avexado!
Nessa manhã, na fazenda do
coronel Messias, dois vereadores de oposição são esperados para o almoço.
–– Lucas, quanto tu achas
que devo pagar a esses trastes da oposição?
–– Coronel vou te dizer uma
coisa, eles só estão na oposição porque estão insatisfeitos com o prefeito.
Talvez ele – o prefeito – não tenha dado muita importância. Não tenha dado
cargos ou dinheiro.
–– Por isso mesmo. Eles
foram eleitos na rabada. Os dois quase não tem votos.
–– Na minha opinião, o
Coronel deve convencê-los a trazer pelo menos mais dois do lado de lá para o
lado cá. E eles não vão cobrar pouco não, viu?
–– Lucas, eu tenho casas na
cidade sem serventia nenhuma. Nem ocupadas elas estão. Não são grandes, mas tem
um valor de mercado muito bom! O que tu achas?
–– O Senhor oferece as casas
sem passar o documento agora e promete uma quantia em dinheiro caso eles
consigam trazer os dois vereadores mais insatisfeito. Aí somamos quatro, o que
já equilibra a balança.
–– É isso mesmo, porque o
presidente da câmara não vem para cá nem a pau.
–– Esse não vem mesmo. É o
mais bem votado na eleição anterior.
–– Lucas tive uma ideia
melhor. Para ficar bem equilibrada mesmo essa campanha, na base do quatro a
quatro, ou seja, a mesma quantidade de vereadores do lado de lá e do lado de cá,
a gente poderia dar um fim no presidente.
–– O Senhor quer tirar o
homem da jogada, Coronel?
–– É claro! Ele é o maior
puxador de votos do prefeito. Se você fizer um serviço bem feito, digo, fazer
parecer um incidente, será uma perda e tanto. Temos que ganhar essa eleição de
qualquer jeito.
–– E o Elesbão ficará
sabendo disso?
–– Ninguém, mas ninguém
mesmo deve saber, nem o Elesbão. Isso fica só entre nós dois e mais dois homens
da nossa confiança.
–– Coronel, essa é uma
jogada muito arriscada num período como esse.
–– Só será arriscada se você
não fizer o serviço direito. Ademais, o Delegado Jaime está na minha folha de
pagamento. Então, quem é que irá investigar isso?
–– Coronel, não é
aproveitando a oportunidade não, visse, mas eu tenho uma caboclinha que gosto
muito. Ela ainda vive na casa dos pais e como o Senhor falou dessas casas na
cidade sem serventia nenhuma, gostaria que o Senhor me desse uma para a gente se
arrumar por lá, fazer um chamego, uns cafunés.
–– Eita Lucas, tu não perdes
tempo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário