–– Gerônimo! Seja bem vindo à casa de Deus, meu
filho!
–– Padre, meu filho nasceu! Quero que o batize!
–– É um menino?
–– Com a graça de Deus, Padre, se chamará
Gerônimo!
–– E quando você pretende trazê-lo aqui para o
batismo?
–– Não quero batiza-lo aqui, Padre!
–– Porque não, filho? Aqui é a casa de Deus!
–– Padre, foi o Senhor mesmo quem disse que onde
houver mais de um, lá estará Deus, então, meu filho nasceu na caatinga e quero
batiza-lo lá. É lá que estão os meus. Dará muito na vista estarmos todos aqui
num mesmo dia, pois ninguém virá desarmado. Não somos bem vindos aqui.
A conversa é mantida no pé
do altar sem muitas cerimônias nem ninguém para se intrometer.
–– Porque você não me mandou um mensageiro?
–– Padre não preciso de mensageiros para
resolver minhas questões.
–– Eu sei, eu sei. E quando você quer o batismo?
–– Daqui a uma semana. E depois dessa eleição
quero casar-me.
–– Que maravilha! Deus ficará contente de sua
união com minha irmã.
–– Não só ele, nós também.
–– Então marque o dia certo que irei. Tenho umas
coisas para falar para vocês sobre seu passado.
–– E tem?
–– Tenho. Quero falar sobre o que aconteceu com
seus antepassados há uns cinquenta anos.
–– Pois pronto! Em sete dias o Senhor irá ao
nosso acampamento, sozinho, daremos proteção no caminho, mesmo que não nos
veja, estaremos esperando pelo Senhor.
–– Levarei dois São Cristãos comigo. São meus
auxiliares.
–– Leve-os e serão bem vindos! Era só isso Padre
Lauro. Estamos acertados?
–– Estamos. Estaremos lá.
–– Adeus Padre!
–– Adeus!
Os homens não perdem tempo e
saem como chegaram, sem muito chamar a atenção a não ser pelo armamento e as
vestes. Seguem pelo mesmo caminho de volta, mas Gerônimo, astuto, decide que
não irão por onde vieram para evitar algum conflito, e então vão por uma
estradinha de chão que vai dar na bodega do Arilson.
–– Capitão tem uma parada ali na frente. Parece
um bar.
–– A caminhada é longa. Vamos parar lá para
comer e beber alguma coisa. Depois partiremos. Chegaremos de madrugada em casa.
–– Certo Capitão!
Os lampiões já estão acesos
na frente da bodega de Arilson. Há cavalos amarrados na cerca, burros também e
alguns jumentos selados, quietinhos esperando por seus donos enquanto jogam e
bebem.
–– Quero entrar sozinho lá. Ninguém nos conhece.
Fiquem atrás e só um entra depois, dois ficam fora. Como se não nos
conhecêssemos, ocupem mesas diferentes ou fiquem em pontos que possam ver tudo
como os calangos. Entenderam?
–– Sim, meu capitão!
E assim é feito.
–– Quero comer alguma coisa e tomar uma
talargada de cachaça.
–– Tenho só panelada, mas preciso requentar –
diz Arilson.
–– Serve. Eu espero.
–– Aquela mesa ali está desocupada Senhor. Pode
se sentar lá.
Os jogadores de baralho nem
notam que um cangaceiro apoderou-se de uma mesa no canto onde dá para ver quem
entra e quem sai; os jogadores de sinuca entreolham-se e continuam jogando,
enquanto um segundo homem adentra o recinto.
–– Estou com uma fome danada, o que tem para
comer?
–– Só tenho panelada!
–– Serve!
–– Sente-se aqui desse lado. Nessa mesa – diz
Arilson, acostumado com todo tipo de gente. Vou esquentar seu prato.
–– Gosto com pimenta. Tem pimenta aí?
–– Tem sim, Senhor. Malagueta!
–– Então bota umas dez! E faz mais dois pratos.
–– Sim, Senhor. Três pratos. Não é?
–– Isso! Faz três pratos!
A luz dos candeeiros,
pendurados nos caibros da biqueira da casa não clareiam muito, e nem dá para
ver com nitidez quem está a dez metros. Nesse momento para um carro na frente
da bodega e descem quatro homens, um deles é o filho mais velho do Coronel
Messias, jovem de aproximadamente 28 anos, metido a valente e conhecido por sua
arrogância por onde passa em toda a região. Só anda armado e deixa a arma à
vista na cintura. Os outros três homens ficam no peitoril da bodega esperando a
reação do patrão.
–– Olá! Estamos com vontade de comer uma
coisinha de sal. O que tem para comer?
–– Tem mais nada não. Se o senhor esperar, posso
fazer uma buchada. Já tá temperada – conforta Arilson por um segundo, enquanto
leva o prato do capitão para a mesa.
–– E esse prato aí, de que é?
––É panelada, mas é desse moço aqui que esperou
requentar.
–– Bota aí umas pingas para nós. Quatro doses.
––Tá bom, Senhor.
–– Avexado cabra!
–– Já tô botando, visse?
O filho do coronel bebe e
pede outra. –– Bebam
meus amigos, é por minha conta. Por conta do Elesbão, nosso candidato! Vou
pagar uma rodada para todos agora. Bote aí bebida para todos. Aliás, tem
quantas garrafas de cachaça aí?
–– Tem bastante, Senhor! – diz Arilson.
(...)
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