–– Que foi que eu disse
Maricota?
–– É. O Senhor tem
experiência e um tino comercial de nascença.
–– É um dom, minha filha, um
dom!
–– Seu Arilson, e os bois? Os
donos deles não veem buscar?
–– Sei não, o delegado disse
que viria pegar hoje e até agora necas de pitibiricas.
–– E a carroça?
–– Pois é, sei também não.
–– Arilson me dê aí o
baralho, para a gente começar os serviços.
–– Rapaz, vocês tem que
consumir alguma coisa. Ou então vou cobrar uma taxa de serviço. Oramarrapaiz!
–– Se apoquente não, moço!
Bote aí logo uma branquinha para molhar a goela.
–– Assim é que eu gosto. E
hoje não tem fiado. Não vendi quase nada ontem por conta do que aconteceu.
–– É no dinheiro, Seu
Arilson.
–– Olhe, avise aos seus
pariceiros para não quebrar os cantos das cartas. Baralho novo é caro e é longe
para compar.
–– Deixe comigo.
–– Você vai ficar
responsável. Esse aí ainda tá na caixa, visse?
–– Eita diacho! Tá novinho
véi!
–– Arilson, cadê a chave da
gaveta da sinuca?
–– Está aqui, olha! Já
avisei. Hoje nada de fiado.
–– Tá certo meu patrão!
–– Ei, tem caldo de que aí?
–– Rapaz, só se for de
feijão! Serve?
–– Não. Tem buchada de bode?
–– Tá quase no ponto – diz a
mulher.
–– Deixa o meu aí. Tô com
uma fome da mulesta!
–– Assim que terminar aviso.
–– Tá bom!
–– Arilson bota uma dose de
água que passarinho não bebe para mim.
–– Mais é agora, avexado.
–– Ei, me diz uma coisa.
Como que está o nosso candidato? Qual é a cotação aí na boca do povo? –
pergunta outro.
–– Rapaz, ele não perde nem
a pau pro Elesbão, candidato do Coronel.
–– Tu acha mesmo?
–– Perde é porra. Se
depender de mim e dos meus amigos, a gente vai botar para eleger de novo. Oh,
homem bom, visse?
–– Rapaz, eu soube que o
Coronel tá gastando meio mundo de dinheiro.
–– É. Eu sei disso. Ali nem
se acaba nem fica pouco. O homem é podre de rico, mas o candidato dele é fraco.
Não tem simpatia. Nunca botou os pés aqui – afirma Arilson.
–– Ah, mas quando tiver mais
próximo da eleição ele vem que é um doce prometendo mundos e fundos.
–– Pode até vir, mas meu
voto é do prefeito.
–– Se ele vier, a gente pega
o dinheiro dele e vota no prefeito.
–– Crie vergonha na cara,
homem. Vote por acreditar num homem que promete e faz. Saiba dizer não a esses
miseráveis que só querem tirar proveito da política e das fraquezas do povo.
–– Tô brincando rapaz.
–– Tá nada. Tu é sem
vergonha que eu sei.
–– Hómi respeite a polícia,
rapá!
–– Polícia de bosta, tu.
–– Como é muié, essa buchada
sai ou não?
–– Calma moço, tá quase no
ponto.
–– Égua Chico Doca, num
aperrei ela não.
–– Vou jogar cinco partidas
aqui pra ganhar o dinheiro dos patos e pagar essa buchada e as pingas.
–– Vai é porra! – responde o
parceiro.
–– Arilson, corta aí um
mercado de fumo para eu fazer um cigarro.
–– Quanto?
–– Dando cinco cigarros tá
bom. Bota desse rolo mais sequinho, o mais verde só serve para mascar.
–– Certo!
–– Ei menino, a buchada tá
pronta.
–– Espera aí. Xô terminar
essa “mão”.
–– Exe abirobado tava num
vexame monstro e agora manda esperar.
–– E pelo visto ele vai é
perder essa partida! – diz Arilson.
–– Vou nada! Dei foi uma
sinuca de bico nele. Sai dessa aí bichão, que eu duvido D-ó-dó!
–– Eita porra! Essa foi de
lascar.
–– Ei desgraça, tu já
começou a roubar? – grita um dos jogadores de baralho.
–– Me respeita cara de
fuinha – diz o outro.
–– Bati, oramarrapá – diz um
terceiro.
–– Bora mudar esse jogo.
Agora é “fó e bate corrido” – propõe outro parceiro.
Nesse momento um menino de
aproximadamente doze anos entra na bodega, pés descalços, só de calção, com um
estilingue no pescoço e uma gaiola feita de talo de buriti na mão direita,
oferecendo um chico preto, um galo campina e um bigodinho (brabos) os dois
primeiros pegos no alçapão e o bigode pegado no visgo.
–– Aí, quem quer comprar um
passarinho?
(...)
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