segunda-feira, 24 de junho de 2019

CANGACEIROS 11




–– Que foi que eu disse Maricota?
–– É. O Senhor tem experiência e um tino comercial de nascença.
–– É um dom, minha filha, um dom!
–– Seu Arilson, e os bois? Os donos deles não veem buscar?
–– Sei não, o delegado disse que viria pegar hoje e até agora necas de pitibiricas.
–– E a carroça?
–– Pois é, sei também não.
–– Arilson me dê aí o baralho, para a gente começar os serviços.
–– Rapaz, vocês tem que consumir alguma coisa. Ou então vou cobrar uma taxa de serviço. Oramarrapaiz!
–– Se apoquente não, moço! Bote aí logo uma branquinha para molhar a goela.
–– Assim é que eu gosto. E hoje não tem fiado. Não vendi quase nada ontem por conta do que aconteceu.
–– É no dinheiro, Seu Arilson.
–– Olhe, avise aos seus pariceiros para não quebrar os cantos das cartas. Baralho novo é caro e é longe para compar.
–– Deixe comigo.
–– Você vai ficar responsável. Esse aí ainda tá na caixa, visse?
–– Eita diacho! Tá novinho véi!
–– Arilson, cadê a chave da gaveta da sinuca?
–– Está aqui, olha! Já avisei. Hoje nada de fiado.
–– Tá certo meu patrão!
–– Ei, tem caldo de que aí?
–– Rapaz, só se for de feijão! Serve?
–– Não. Tem buchada de bode?
–– Tá quase no ponto – diz a mulher.
–– Deixa o meu aí. Tô com uma fome da mulesta!
–– Assim que terminar aviso.
–– Tá bom!
–– Arilson bota uma dose de água que passarinho não bebe para mim.
–– Mais é agora, avexado.
–– Ei, me diz uma coisa. Como que está o nosso candidato? Qual é a cotação aí na boca do povo? – pergunta outro.
–– Rapaz, ele não perde nem a pau pro Elesbão, candidato do Coronel.
–– Tu acha mesmo?
–– Perde é porra. Se depender de mim e dos meus amigos, a gente vai botar para eleger de novo. Oh, homem bom, visse?
–– Rapaz, eu soube que o Coronel tá gastando meio mundo de dinheiro.
–– É. Eu sei disso. Ali nem se acaba nem fica pouco. O homem é podre de rico, mas o candidato dele é fraco. Não tem simpatia. Nunca botou os pés aqui – afirma Arilson.
–– Ah, mas quando tiver mais próximo da eleição ele vem que é um doce prometendo mundos e fundos.
–– Pode até vir, mas meu voto é do prefeito.
–– Se ele vier, a gente pega o dinheiro dele e vota no prefeito.
–– Crie vergonha na cara, homem. Vote por acreditar num homem que promete e faz. Saiba dizer não a esses miseráveis que só querem tirar proveito da política e das fraquezas do povo.
–– Tô brincando rapaz.
–– Tá nada. Tu é sem vergonha que eu sei.
–– Hómi respeite a polícia, rapá!
–– Polícia de bosta, tu.
–– Como é muié, essa buchada sai ou não?
–– Calma moço, tá quase no ponto.
–– Égua Chico Doca, num aperrei ela não.
–– Vou jogar cinco partidas aqui pra ganhar o dinheiro dos patos e pagar essa buchada e as pingas.
–– Vai é porra! – responde o parceiro.
–– Arilson, corta aí um mercado de fumo para eu fazer um cigarro.
–– Quanto?
–– Dando cinco cigarros tá bom. Bota desse rolo mais sequinho, o mais verde só serve para mascar.
–– Certo!
–– Ei menino, a buchada tá pronta.
–– Espera aí. Xô terminar essa “mão”.
–– Exe abirobado tava num vexame monstro e agora manda esperar.
–– E pelo visto ele vai é perder essa partida! – diz Arilson.
–– Vou nada! Dei foi uma sinuca de bico nele. Sai dessa aí bichão, que eu duvido D-ó-dó!
–– Eita porra! Essa foi de lascar.
–– Ei desgraça, tu já começou a roubar? – grita um dos jogadores de baralho.
–– Me respeita cara de fuinha – diz o outro.
–– Bati, oramarrapá – diz um terceiro.
–– Bora mudar esse jogo. Agora é “fó e bate corrido” – propõe outro parceiro.
Nesse momento um menino de aproximadamente doze anos entra na bodega, pés descalços, só de calção, com um estilingue no pescoço e uma gaiola feita de talo de buriti na mão direita, oferecendo um chico preto, um galo campina e um bigodinho (brabos) os dois primeiros pegos no alçapão e o bigode pegado no visgo.
–– Aí, quem quer comprar um passarinho?
(...)

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