quinta-feira, 30 de abril de 2020
Cangaceiros 12
–– Tô brincando rapaz.
–– Tá nada. Tu é sem vergonha que eu sei.
–– Hómi respeite a polícia, rapá!
–– Polícia de bosta, tu.
–– Como é muié, essa buchada sai ou não?
–– Calma moço, tá quase no ponto.
–– Égua! Chico Doca, num aperrei ela não.
–– Vou jogar cinco partidas aqui pra ganhar o dinheiro dos patos e pagar essa buchada e as pingas.
–– Vai é porra! – responde o parceiro.
–– Arilson, corta aí um mercado de fumo para eu fazer um cigarro.
–– Quanto?
–– Dando cinco cigarros tá bom. Bota desse rolo mais sequinho, o mais verde só serve para mascar.
–– Certo!
–– Ei menino, a buchada tá pronta.
–– Espera aí. Xô terminar essa “mão”.
–– Exe abirobado tava num vexame monstro e agora manda esperar.
–– E pelo visto ele vai é perder essa partida! – diz Arilson.
–– Vou nada! Dei foi uma sinuca de bico nele. Sai dessa aí bichão, que eu duvid-ó-dó!
–– Eita porra! Essa foi de lascar.
–– Ei desgraça, tu já começou a roubar? – grita um dos jogadores de baralho.
–– Me respeita cara de fuinha – diz o outro.
–– Bati, oramarrapá – diz um terceiro.
–– Bora mudar esse jogo. Agora é “fó e bate corrido” – propõe outro parceiro.
Nesse momento um menino de aproximadamente doze anos entra na bodega, pés descalços, só de calção, com um estilingue no pescoço e uma gaiola feita de talo de buriti na mão direita, oferecendo um chico preto, um galo campina e um bigodinho (brabos) os dois primeiros pegos no alçapão e o bigode pegado no visgo.
–– Aí, quem quer comprar um passarinho?
–– Ninguém quer passarinho aqui não, menino – diz um dos jogadores de sinuca.
–– Moço, é para ajudar lá em casa. Comprar arroz e feijão.
–– Vai estudar – fala o parceiro no jogo – se eu tivesse estudado num tava aqui jogando sinuca, sendo besta.
O menino sai de mesa em mesa oferecendo os pássaros e ninguém dá a mínima atenção. Jogador de baralho só tem olhos para as cartas. Não ouve ninguém fora do jogo. Fica matutando o jogo até descobrir qual a próxima cartada. Tem uns que varam a noite e ficam de olhos fundos.
O garoto não tem argumentos para convencer e sai, mas antes, oferece ao dono do recinto.
–– Seu Arilson compre pelo menos o bigodinho, ele cantará rapidinho assim que deixar de ficar “enfesado”, pra eu comprar nem que seja só o feijão para comer com farinha e sal. Lá em casa num tem nada hoje para comer – diz a criança com cara de tristeza.
–– Menino quanto é os três com gaiola e tudo?
–– Ah, só os passarinhos é uma coisa, agora com a gaiola é outra!
–– Sim, mas quanto é? – Insiste Arilson.
–– Bote preço! Eu tô é precisando mesmo.
–– É o seguinte: Vou lhe dar o arroz, o feijão, a farinha e o sal, mas vou soltar os pássaros e quebrar a gaiola.
–– Faça isso não seu Arilson! Uma gaiolinha dessas dá um trabalho danado para fazer.
–– Menino, você gostaria de estar numa jaula?
–– Não Senhor.
–– Então vá estudar! E venha aqui uma vez por semana que lhe dou arroz e feijão se você for para a escola ao invés de caçar passarinhos.
–– Vai me dar tudo isso agora?
–– Vou.
–– Então pode soltar e quebrar a gaiola.
–– Sim, mas você vai para a escola?
–– Não tenho mais pai para me matricular e minha mãe não tem condições de ir lá no grupo escolar. É muito longe.
–– Pois depois vem aqui que te levo para matricular, viu?
–– Viu!
–– Olha o Arilson parecendo o Papa, dando exemplo.
–– E tu tava só caladinho aí, observando, né?
–– É, mas já, já vou voltar para casa. Minha mulher tá esperando um bruguelo! – afirma Benedito.
(...)
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