Herança Maldita - Parte IV
Por Carlos Holanda
Por Carlos Holanda
– Já que você está grávida de quatro meses,
amanhã mesmo falarei com os pais dele e marcaremos o casamento para daqui a um
mês.
– Tenha calma.
– Ora tenha calma. Você quer deixar a barriga
crescer mais ou quer casar com um bebê de colo? Fica linda na igreja com um
bebê nos braços. E do jeito que o povo daqui gosta de fofoca, não irão falar
bem de jeito nenhum.
– Eu não...
– Não o que? Não estava preparada? Pois fique
sabendo que tenho dinheiro para bancar essa cerimônia no civil e no religioso.
– Então se é assim, casaremos.
– E vou lhe dizer mais uma coisa, ele vai ter
que vir morar aqui. Quero ver esse boy pegar no cabo duma enxada, tirar leite
da vaca, alimentar os porcos, as galinhas e cuidar de você e do bebê.
– É assim que vai ser?
– É. Você pode não ter pai nem mãe, mas eu
estou aqui para lhe proteger e esse filho da puta vai ter que assumir que é
homem. E já chega de papo por hoje. Vou dar as instruções para os homens
começarem a trabalhar. Bote água no feijão para mais duas bocas. Vou pegar as
coisas que trouxe do mercado.
– Está bem.
O dia termina, e a boquinha da noite,
Gerônimo chama a irmã e pede desculpas pelas ofensas e grosserias. Foi um
momento de surpresas, mas o susto passou. Promete que dali para frente a
tratará como antes, com amor, afeição e carinho. Júlia não guarda rancor e logo
estão na paz planejando o futuro.
De manhã cedo, Gerônimo ordena que os homens contratados
retirem todas as placas da entrada que amedrontam o povo e as substitua por
outras com o nome da propriedade e outras para dar as boas vindas. Também manda
roçar o mato para retirar o ar fúnebre e deixar um acostamento. E enquanto eles
trabalham nessa empreitada, o moço vai à cidade acertar com os pais de Xavier a
data do casamento.
Na Delegacia o perito recebe a ordem do
promotor providenciada pelo delegado para desenterrar os corpos das vítimas no
cemitério e dá continuidade junto com legistas e policiais.
A imprensa pede autorização para acompanhar o
desenrolar dos fatos e é concedida pelo delegado.
O perito examina cada esqueleto
minuciosamente e encontra a metade de um cordão fino de prata e uma medalha
encravada entre os dedos de uma das ossadas. Esse era um corpo masculino e
talvez tenha tido um contato bem próximo com o agressor. É o que ele supõe.
Foram examinados três cadáveres e ele decide deixar para o outro dia seu
trabalho. Volta para delegacia e sugere ao delegado que muito provavelmente
cada jovem tinha um aparelho de celular. Foram encontrados quatro. Indaga onde
estão os outros dois uma vez que nos que foram encontrados não havia nada
relacionado aos crimes. Então, ele decide fazer uma visita à casa de Júlia para
investigar como a medalha e parte do colar foi parar no cemitério. Sugere ao
delegado que outros policiais voltem ao local do crime para tentar encontrar os
outros celulares e usa o termo escarafunchar o local. Pede também para ver
todos os pertences das vítimas; bolsas, mochilas, barracas, calçados e roupas que
foram apreendidas no dia do evento na floresta e tudo mais que possa servir
como possíveis provas ou pistas de alguma coisa que incrimine o suspeito.
Ainda nessa manhã, Gerônimo tranca-se no
quarto, liga o notebook sobre a cama, põe o cabo USB conectado com o celular
que encontrou na cena do crime e transfere todos os arquivos para observar na
tela maior. Vê fotos que não tem nada a ver com o que aconteceu e encontra a
pasta de vídeos. Essa é a parte que lhe interessa. Assiste pacientemente um por
um dos existentes no celular, e até que enfim, no último, o mais recente, é
sobre o ocorrido no bosque. Nas cenas tremidas, instantes antes de o agressor
atacar ele vê a filmagem como se o jovem estivesse registrando o local para
postar depois nas redes sociais, cenas essas que mostram o acampamento com três
barracas já montadas, uma vez que eram três casais; e prossegue vendo as
árvores e tudo mais ao redor, mas a cena mais chocante está por vir, que é
exatamente o close de cipós que se locomovem como se fossem acionados por
controle remoto. É incrível – pensa ele. E continua a assistir. Os cipós
parecem cobras vivas na areia quente, mas o jovem não se dá conta de que essas
raízes esverdeadas estão indo em sua direção e laçam seus pés, enroscam-se em
seu corpo, asfixiando-o e finalmente o arrastam para longe de seus amigos. O
aparelho ainda está em sua mão direita e ele consegue mesmo sem poder falar ou
gritar para avisar os amigos, filmar um vulto feminino, encapuzado, macabro.
Era como se os cipós nascessem das mãos desse vulto que o enforcara. Nesse momento
o celular cai e fica fora de área.
Gerônimo gela a espinha, fica em estado de
choque e com medo dessa descoberta. Como pode ser uma aberração desse tipo
matar tanta gente em um lugar deserto e nunca ter-se ouvido falar nada a
respeito?
– indaga-se o rapaz, que continua curioso e apreensivo com esse
mistério logo em sua propriedade. Bom, pelo menos ele constata que o monstro é uma
fêmea. E em pouco tempo ele deduz que os jovens não tiveram chances. Foram
pegos de surpresa um por um.
Júlia avisa que o almoço está na mesa e diz
para chamar os homens.
– Gerônimo, faz mais de duas horas que você
está trancafiado nesse quarto. Vem almoçar e chama seus funcionários.
– Já estou indo. Faça-me o favor, chame-os.
– Certo.
À tarde, Diego, o perito, acompanhado do
delegado e mais dois investigadores da polícia fazem uma visita a Júlia, que no
momento está sozinha na casa. Os homens contratados estão no campo, colocando
estacas que servirão para as cercas e Gerônimo havia saído; foi comprar arame
farpado no comércio da cidade. Júlia ouve o barulho dos carros e vai para
porta.
– Boa tarde minha jovem. Presumo que você
seja a Júlia – diz o perito.
– Sim, sou eu. E o Senhor quem é?
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