Por Carlos Holanda
– Bem, já fizemos de tudo para solucionar
esses casos. E estamos empenhados nisso.
– Ah, então quer dizer que depois desses anos
todos, vocês deixaram esfriar as coisas e você me diz que estão empenhados?
– Gerônimo, escute-me, colocamos essa área
sob vigilância durante quase um ano. Interrogamos todos os meliantes da cidade
e redondezas, mas ninguém sabe de nada. Parece que o facínora sumiu. Evaporou.
– Ninguém some sem deixar pistas. Até porque
não é um fantasma.
– É. Não é fantasma, mas parece ser
sobrenatural. Não há digitais num raio
de dois quilômetros. Vasculhamos essa área como quem caça uma agulha no
palheiro.
– E agora, o que vai acontecer? Vocês vão
esperar haver mais mortes para seguir pistas?
– Nós iremos encontrar o assassino. Tenha
certeza disso.
– Não estou acreditando nisso não, amigo.
– Bem, eu vim aqui logo que soube que você
havia chegado. Vim prestar minhas condolências, lhe colocar a par da situação e
dar um abraço.
– Eu agradeço por tudo. Afinal, fomos criados
juntos. Amanhã lhe farei uma visita quando for à cidade.
– Está bem. Tenho que ir agora. Obrigado pelo
café Júlia. Estava uma delícia. Ah, fiquem com meu cartão e qualquer coisa, me
liguem, por favor. Até amanhã.
– Até amanhã - diz Gerônimo, enquanto Júlia
apenas acena com a mão.
– Essas histórias são muito estranhas. Júlia,
ainda tem algumas coisas que não tirei da camionete. Vou lá pegar e já volto.
– Ok. Vou preparar uma galinha ao molho pardo,
bem gostosa para nós.
No almoço, Júlia diz para o irmão que tem uma
coisa importante para lhe contar, mas esse ainda não é o momento certo. Levanta-se
bruscamente da mesa e corre para o banheiro.
– Júlia, o que houve? Você está bem?
– Estou. Só um momento.
– Meu Deus do céu. O que está acontecendo
aqui? Só encontrei problemas até agora - pensa Gerônimo.
– Pronto. Acho que a comida não me fez bem.
– Você vomitou.
– Foi. Mas já passou. Estou bem. Vou para meu
quarto descansar um pouco.
– Vai. Eu também vou tirar uma soneca. Ainda
estou cansado da viagem.
Gerônimo pega um livro no criado mudo,
folheia, coloca de volta onde estava e deita-se na cama. Não se dá conta da
hora e acorda ao anoitecer.
– Já é noite. Dormi como uma pedra e ainda
estou com sono – diz para a irmã.
– Pelo visto, você estava cansado mesmo.
- É. Dirigi por milhares de quilômetros até
chegar aqui. Faço mais isso não. O que tem pra comer?
– Ah, eu não fiz janta. Tem queijo, presunto,
ovos e pão. Faz um sanduiche.
– É o que vou fazer.
Júlia liga a televisão bem na hora do
noticiário. O delegado está dando entrevista sobre os assassinatos e afirma com
todas as letras que conseguirá prender os assassinos se que é que é mais de um.
Diz também que pediu reforço policial e que novas investigações serão
iniciadas, pois, um perito do governo já está a caminho. A repórter diz que as
famílias estão indignadas e revoltadas com a falta de justiça.
– Casos como esses não costumam acontecer
numa cidade pacata como essa. Outros crimes comuns foram solucionados
rapidamente e esses não ficarão impunes – finaliza o delegado.
Júlia assiste a uma novela enquanto o irmão
come um sanduiche.
– Sim, você vai me contar agora o que tinha
para dizer no almoço?
– Não é tão importante assim. Deixa para lá.
– Então está bom. Você é quem sabe. Esqueci de
comprar umas cervejas na cidade.
– Pois é. Como não bebo, não tem. Toma suco.
Acho que ainda tem aí.
– Vou ler um livro lá no quarto.
– Fecha a casa, Gerônimo. Verifica a porta da
cozinha.
– Tranquilo. Pode deixar.
De manhã cedo
– Júlia eu gostaria que você fosse comigo no
local onde os meninos foram mortos. Pode ser?
– Eu não gosto disso. Lá é assustador. Mas,
eu te levo sim. Vamos.
– Espera, deixe-me pegar meu rifle. Nunca se
sabe o que nos aguarda, não é mesmo?
– Você tem um rifle?
– Tenho sim. Trouxe escondido na camionete. E
trouxe bastante munição também.
– O que mais que você trouxe escondido?
– Não queira nem saber. Brincadeira. Vamos?
– Vamos.
Os dois irmãos saem de casa e entram na
floresta densa, seguem para o local dos crimes.
– Você já esteve aqui antes?
– Só no dia que a polícia veio, quando
encontraram os cadáveres. Um monte de gente veio ver os corpos, até a televisão
veio filmar tudo.
– Eu só não entendo porque esse tempo todo
nunca descobriram nada.
– É complicado. Um mistério. Mas a polícia
está fazendo o papel dela. Investigando.
– Eu acho que deveria haver mais empenho.
– Eu também acho.
Depois de muito caminhar por caminhos e
trilhas quase virgens eles chegam ao local.
– É aqui irmão. Ali ficava o acampamento e o
resto você já sabe. Vou sentar para esfriar o sangue.
– Certo vou dar uma olhada por aí. Espere
aqui.
– Pode deixar.
Gerônimo caminha devagar e com o olhar
atento, como se procurasse vestígios de algo que ele não perdeu, olha para as
árvores ao redor, para alguns tornos enfiados pela polícia para demarcar o
local e não encontra nada.
– Vamos voltar.
– Encontrou alguma coisa?
– Ainda não. Realmente faz muito tempo. O
terreno já foi pisado por muita gente.
– Bem, então vamos embora.
Em casa, Gerônimo avisa que essa noite irá
caçar pelas redondezas. Ele conhece bem a região desde menino, aliás, pediu à
irmã para ir ao local somente para saber onde ficaria, sua intenção é averiguar
o lugar a sós. E ele sabe que ela não deveria saber disso.
– Você sabe da minha lanterna?
– O que você vai fazer com lanterna?
– Me deu vontade de caçar por aí.
– Deve estar no armário da cozinha. Mas você
vai caçar sozinho?
– Júlia, eu conheço bem nosso terreiro e não
irei muito longe. Deseje-me sorte.
– Está bem. Boa sorte. Tome cuidado.
– Tomarei.
Gerônimo volta ao local do crime e deduz que,
a noite, se houver algum objeto que não possa ter sido visto pelos
investigadores ou por ele à luz do dia poderá reluzir à noite, quem sabe e é
com essa convicção que ele segue. Quando chega ao acampamento, faz vários trajetos de ida e volta, imagina as cenas das
vítimas sendo pegas de surpresas, o agressor arrastando pessoas e é nesse
vai-e-vem que com a lanterna em punho, andando por lugares que pensa que os
investigadores não pisaram que ele escorrega numa vala e vê coincidentemente um
aparelho de celular enterrado pela metade. O jovem o apanha, limpa, vê que está
descarregado, claro e guarda no bolso da calça jeans. É hora de voltar. Isso o
ajudará bastante. A sua curiosidade é tanta que sua vontade é de ver a câmera
funcionando. Pela sua experiência em redes sociais, sabe que um garoto desse
século filma quase tudo. E é isso que ele pretende encontrar.
Quando Gerônimo chega à sua casa, senta-se
numa cadeira que está no alpendre e fica por um bom tempo tentando ligar os pontos,
ou descobrir algo que ninguém ainda viu. Os galos anunciam o dia e ele se
recolhe.
– Bom
dia! Nem vi quando você chegou. Como foi sua caçada? Não matou nada?
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