domingo, 22 de janeiro de 2017

GINA, A Caçadora VII - Pedófilos

Gina passeia pela cidade, pelas praças, e resolve ir à igreja fazer uma oração. Na verdade ela só foi à igreja duas vezes: uma quando foi batizada e a outra na missa de sétimo dia da sua mãe. Demora pouco mais que os outros e ao sair, percebe que um menino está muito triste sentado na calçada. Senta ao seu lado e puxa conversa. O garoto que tem pouco mais de doze anos não dá a mínima atenção. Não compartilha com o que ela fala. Seu pensamento está distante. Ela não é de desistir facilmente e parte para outra tática.


- Lá vem o carrinho do picolé. Nesse calor é bom! Quer um? Eu pago.
O menino meio desconfiado, aceita, mas não fala nada. Apenas acena com a cabeça.
Gina insiste mais um pouco, mesmo sabendo que tem de cuidar de seus afazeres lá no povoado.
- Vamos lá, garoto, gostou do picolé?
- Gostei!
- Cadê seu pai e sua mãe?
- Moro com meu padrasto. Ele bebe muita cachaça, se embriaga e me bate. Não posso voltar agora pra casa, a essa hora ele já bebeu.
- Quer ir lá para casa comigo?
- Não posso.
- Por quê?
- Sabe o que é um coroinha?
-Sei. Você ajuda o Padre na missa?
- Sim.
- Por que você não conta para ele sobre seu pai?
- É pior.
- Por que é pior?
- O Padre é quem dá dinheiro para meu pai.
- E por que ele faz isso? Seu pai não é quem poderia ajudar a igreja.
- Acho que sim.
- Então! Qual é o motivo dele dar dinheiro para seu pai?
- Moça,  preciso ir...
- Para onde você vai?
- Não sei.
- Como é seu nome?
- Gabriel Sousa.
- Gabriel, onde você mora?
- Na última casa, daquela rua. Bem em frente a um curral de bois. Uma casa amarela da calçada alta.
- Tudo bem! Se eu vier à missa de domingo, você fala comigo? Seremos amigos?
- Sim, falo.
- Então, fica com Deus!


Quando Gina vira as costas, Gabriel corre e lhe dá um abraço bem apertado. Ele sentiu que poderia confiar nela.
Despedem-se e cada um segue seu rumo.
Já em casa, no almoço, Gina comenta com a família o ocorrido.
- Júlio, aconteceu uma coisa hoje.
- O que foi?
- Vi um menino triste e meu coração pediu que falasse com ele.
- E daí, Gina? Tem um monte de crianças sem pai, sem mãe ou abandonadas nessa cidade.
- Sim, tem, eu sei, mas esse garoto é um caso à parte.
- Como você sabe disso?

Seu João Lobo entra na conversa.
- É melhor vocês comerem. Tem muita coisa para fazer. Já não basta os problemas daqui?
- Pai, eu vi nos olhos dele, que tem algo errado. Ele disse que o Padre dá dinheiro para o pai dele.
- Oxe! Ele só está ajudando mais um cristão. Isso é normal. Mas, porque o Santo homem iria dar dinheiro assim?
- Não sei Júlio. É isso que me deixa intrigada.
- Gente, vamos cuidar da labuta daqui, que o Padre cuida da Igreja e dos fiéis dele.
- Pai, vamos ouvir a Gina.
- Não tenho mais nada para falar. Domingo irei para a missa novamente e depois me encontrarei com ele!
- Vai virar beata agora, irmã?
- Júlio deixe sua irmã em paz.
- Terminaram? Vou lavar os pratos só pra dar uma mãozinha pra vocês!
- Eu vou te ajudar aqui limpando a casa.
- Júlio, ajude-a, que vou campear umas vacas que estão perdidas, desgarradas por aí.
- Tá bom, pai.
- Júlio, nesse angu tem caroço...
- Te mete com religião não, Regina. Deixa esse povo para lá.
- Júlio, eu desconfio que há algo errado com aquele menino. Não engulo essa de Padre dar dinheiro para homem, quanto mais quando a família não tem a mãe e ele é um cachaceiro.
- Ave Maria! Aqui em casa a nossa mãe não está presente, faz tempo.
- É. Você tem razão até certo ponto, mas o pai é um homem digno, trabalhador e nunca levantou a mão para nenhum de nós. A nossa mãe, até onde eu sei, também foi muito honesta e exemplar.
- Vamos falar nisso mais não. Você sabe que quando lembro, dá vontade de chorar.
- Tá bom então, homem sensível. Vamos terminar essa labuta aqui.
Enquanto isso, na Casa Paroquial o Padre Ângelo chama todos os coroinhas para uma reunião.
- Já que estão todos aqui, vamos fazer a escalação dessa semana, certo?  O Gabriel dorme hoje na Casa Paroquial, os outros estão dispensados para irem para casa. O Padre Francisco já está com a relação de quem terá folga esse mês. Temos muitos pães aí, e cada um de vocês pode levar uns para casa.

Os garotos levantam-se da mesa e correm para os cestos de pães, pegam o que convém, e vão embora.
- Gabriel, vá se lavar, faça sua refeição e vá para o quarto, enquanto tenho uma conversa com Padre Francisco.
- Sim, Senhor!
- Francisco, tu chegou aqui primeiro, ninguém desconfia dessa falcatrua. Já faz um ano que celebra missa. Você é um homem "preparado". Já temos um bom dinheiro guardado. No final do ano vamos repassar essa Igreja para outros padres.
- Concordo com você! De anjo você não tem nada, além de pedófilo, você assassinou um padre e tomou o lugar dele. Vamos continuar com o plano.
- Meu caríssimo Ângelo, não sei qual a necessidade que teve de você fazer essas observações a meu respeito. Melhor ter cuidado com o que fala.
- É só para lembrar, que eu planejo e você executa. Pensei ter dito antes que passaríamos três anos em cada lugar. Então você vem com essa proposta. Assim, passa por cima das minhas regras.
- Não vou discutir com você. Irei fazer o que você disser. Desconsidere tudo que falei.
- Já até esqueci. Vai dormir com teu garoto, e olha, esse menino tá esquisito. Eu não aprovo isso. Em outras circunstâncias eu te mataria.
- Bom saber disso. Nós não estamos nos entendendo muito bem. Boa noite, Padre! Vou me divertir um pouco.
- Deus tenha misericórdia da tua alma, e duvido muito que ele tenha.
- Tu cuida da tua vida, que cuido da minha. Ah, e mais uma vez, cuidado com o que você fala.
- Isso é uma ameaça, Padre?
- Não. Vai, vai...


Os dias passam e chega o final de semana. Um lindo domingo ensolarado. Logo os coroinhas começam os preparativos para missa.
- Hoje vamos falar da parábola do bom filho que retorna à casa do pai...

Após a celebração, Gina é a primeira que sai e vai para um ponto do adro da igreja esperar por Gabriel que logo se apresenta como prometeu.

- E aí Gabriel Souza, tudo bem?
- Não. Não está tudo bem.
- O que houve agora?
- Quero te contar uma coisa. Um segredo. Posso confiar mesmo em você?
- Claro! Vim aqui pra te ajudar.
- Então vamos para a praça. Lá é melhor.
- Vamos sim!

À sombra de uma mangueira, o menino conta tudo o que se passa naquela casa paroquial. Diz também ter ouvido sobre o outro Padre que, na verdade, não foi transferido para outra cidade e sim assassinado pelos atuais e setá enterrado no quintal..

- Isso que você me disse é muito grave. Quem mais sabe dessa história?
- Só eu ouvi o que eles tramaram, mas já contei para os outros garotos.
- Quero conversar com vocês todos juntos. Pode ser?
- Pode. Vou falar com eles e marcar uma horinha dessas.
- Amanhã, então, certo?
- Certo! Mas o que você vai fazer?
- Não se preocupe. Vamos tomar providências. Isso vai acabar logo.
- Tomara mesmo. Eu não aguento mais.
- Seu pai também será preso por conivência com esses falsos padres.
- Não me importo. Já não sinto mais nada por ele também.
- Certo. Tenho um plano. Amanhã depois da reunião, vocês todos terão que se esconder e não retornarão à igreja. Deixem comigo que farei o resto.
- Mas o que você vai fazer, mesmo?
- Gabriel, meu anjo, confie em mim. Vai dar tudo certo. E não faltem ao nosso encontro.
- Tá bom. Acredito em você! Agora tenho que ir.
- Vai com Deus!

No dia seguinte, após a reunião, só Gina saberá onde encontrará os garotos. Sua primeira visita é à igreja...

- Bom dia, Padre!
- Bom dia, minha filha. Seja bem vinda à casa de Deus! Em que posso lhe ajudar?
- Padre, sei que não é um momento apropriado, mas preciso me confessar.
- Bem, a casa do Senhor está aberta a todos independente de horário. Vamos ao confessionário.
- Vamos. Obrigado pela sua atenção.
- Conte-me seus pecados, minha filha.
- Padre, eu tenho muitos. Daria um livro. São tantos que até eu tenho medo.
- Comece a contar e lhe darei uma penitência..
- Todos os meus pecados foram cometidos por justiça. Agora vem a parte interessante. Conte-me os seus.
- Minha filha, eu não entendi.
- Molestar crianças, seduzir e praticar ato sexual com menor é crime.
- Do que você está falando?
- Sei também que vocês assassinaram o Pároco dessa igreja e tomaram o lugar dele. 
Estão enganando uma cidade inteira. Acaba aqui e agora essa farsa.

- Quem é você? Quem te mandou aqui?

Antes que o falso Padre possa tomar qualquer decisão, uma corda laça seu pescoço e o enforca. Gina sempre age com planejamento.

- Você nunca irá descobrir.

Gina vai à delegacia contar que viu o Padre enforcado no confessionário e como testemunhas, outros fiéis e os garotos, que confirmam as desavenças entre os dois e os crimes de pedofilia. O comparsa vai preso como cúmplice dos crimes e leva a culpa por ter assassinado o Padre. O pai de Gabriel também é indiciado e preso.

Gina leva o garoto para morar em sua casa por um bom tempo e conta à sua família que está tudo bem. Era só um mal entendido, mas explica que o pai do garoto é um beberrão e por isso ele passará uns dias em sua casa.

- Se cada um fizer um pouco pelo outro, teremos um mundo melhor. Gina.

Outra jornada nos aguarda...

Carlos Holanda

Nenhum comentário:

Postar um comentário