sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

A LISTA DO CORVO por Carlos Holanda


           

            Os corvos fazem parte de muitos mitos.


            Desde o Tibete até a Grécia, as pessoas acreditavam que os corvos eram mensageiros dos deuses. Durante as batalhas, as deusas celtas se transformavam em corvos.  Já Odin, o deus da mitologia nórdica, tinha dois corvos – Hugin (pensamento) e Munin (memória) –, que voavam ao redor do mundo durante o dia e, à noite, contavam ao deus tudo o que tinham visto.

            Os chineses diziam que os corvos traziam um clima ruim para as florestas para avisar às pessoas de que os deuses passariam por ali. E algumas tribos nativas da América adoravam o corvo como uma deidade, além de o descreverem como um “pregador de peças” que estaria envolvido na criação do mundo.

            Elias é um empresário bem sucedido, dono de um patrimônio milionário, apesar de ser uma riqueza suspeita.

– Juliana! Venha aqui, por favor! – berra o chefe pelo interfone para a secretária, e enquanto ela entra aflita, pois já sabe do temperamento dele, o homem continua a falar austeramente – quero saber como em uma sala fechada, climatizada, com segurança e tudo mais, veio parar em cima da minha mesa a porra de uma pena preta?
– Não, não sei chefe! Desculpe-me – gagueja a moça.
– Quem mais entrou nesta sala hoje?
– Só o Senhor e mais ninguém. Ontem o Senhor teve uma reunião com nove pessoas, lembra?
– Sim, claro! Chame o segurança. Já!
– Sim, Senhor! Deve ser só uma brincadeira de um dos seus sócios.
– Brincadeira é? Isso aqui virou um poleiro agora?
– Não quis dizer isso.
– Saia e faça o que mandei.
            Os dois seguranças entram na sala e prostram-se à frente do homem.
– Há quantos anos vocês trabalham aqui?
– Há pelo menos dez anos, chefe! – responde um dos homens.
– Agora, digam-me! Eu tenho cara de quem cria urubus?
– Claro que não, chefe! – responde o outro segurança sem entender nada.
– Pois me expliquem como a porra dessa pena preta veio parar justamente em cima da minha mesa.
– Deixe-me ver. Não é uma pena de urubu. É de corvo.
– E como você sabe disso, você o viu entrar aqui?
– Não Senhor! Mas já fui caçador algum tempo, antes de vir para cá. Reconheço uma pena de corvo em qualquer lugar do mundo.
– Ok! Então investiguem isso e deem-me uma resposta o mais rápido possível. Agora saiam!

            Longe dali, garotos de um bairro da periferia jogam futebol numa quadra inacabada. Ao redor, grades comidas pela ferrugem e portões que rangem, denunciam o abandono do lugar pelo poder público.

– E aí molecada, como vocês estão? – indaga Dick quase gritando.
                                                                                                                                             Os garotos com fome de bola olham e acenam fazendo  gestos de que está tudo bem.
– Olá Valdick! Tudo bem com você? – pergunta o pai de um dos meninos.
– Estou bem, quero dizer, mais ou menos. Arranjei um novo emprego. E você, como vai?

– Bem do jeito que deus quer. Continua treinando artes marciais?
– Sim. Claro! Estou intensificando mais. Ah, eu trouxe uma bola novinha em folha pra eles!
– Que beleza! A deles já está toda cheia de remendos. Ei, ei meninos, venham aqui. Olha o que o Dick trouxe para vocês – o homem joga a bola no meio da quadra. A garotada faz a festa e grita “valeu Dick”. Depois de receber os agradecimentos e alguns abraços, o rapaz cumprimenta o velho amigo e vai embora.
– Até mais, Rubem. Amanhã a gente se vê.
– Até mais, Dick.
            Na boate de Lennon, sócio de Elias, um motoqueiro anônimo entrega ao porteiro uma caixa pequena embrulhada em papel de presente.
– O que é isso? – indaga o brutamonte vestido de terno preto, segurança do local.
– É um presente para o Senhor Lennon.
– Quem mandou?
– O nome está dentro da caixa. Entregue a ele.
– E quem é você?
– Só um entregador – o homem acelera a moto e some.
Continua...


Nenhum comentário:

Postar um comentário